GOB17 é sobre transição, sobre movimento. Trocar a "Big Apple" pelo Mediterrâneo é mais do que um ato de vontade, é um desafio complexo. Ultimamente, cada vez mais pessoas decidem atravessar o oceano para começar uma nova vida, e muitas delas escolhem uma cidade que supera os rankings sobre as melhores cidades para se viver: Valência, uma cidade acolhedora e fácil de percorrer, com um clima imaculado e uma enorme tradição festiva.
Vivemos nas cidades num determinado momento da sua história. Elas crescem e mudam como as pessoas que nelas vivem, num movimento constante que nos obriga a mudar com elas. Os protagonistas desta história, uma família formada por um casal e um cãozinho brincalhão, decidiram que era o momento certo para trocar o racionalismo calculado do meio século americano pelo palimpsesto cultural mediterrânico.
Encontrar um bom ponto de partida foi crucial. O perfeito é sempre antes da compra, para que nenhuma característica oculta possa condicionar o resultado. Depois de um bom briefing e de um estudo pormenorizado das necessidades, começou a procura. Foram visitados vários imóveis até que surgiu o escolhido, um "rara avis" dentro do Bairro Histórico. Perto do parque do rio Túria, um edifício nobre do século XIX ergue-se numa esquina particular com duas fachadas principais e um pátio interior cheio de árvores. A sua distribuição original, caótica e retorcida, adapta-se ao local singular, alimentando-se da envolvente e reclamando o seu lugar. É curioso pensar que este tipo de espaços singulares e erráticos foram os que, na mesma época, os comissários Randel jr, Morris, Rutherfurd e De Witt tenderam a evitar para o desenho do Loteamento de Manhattan. A grelha assegurava as mesmas condições de luz e ar para todos os edifícios, perfeitamente racional, mas sem espaço para improvisação.
Este projeto pretende ligar todos estes elementos, fazendo não só com que os espaços estejam visualmente ligados, mas criando uma dinâmica em torno do espaço. Dois volumes principais organizam-no, dando as boas-vindas ao visitante, apontando a vista, e permitindo que a presença dura e lapidosa da cidade penetre na natureza orgânica e verdejante do interior. Relacionam-se com alguma distância com a construção pré-existente, deixando expostas as estruturas originais.
A materialidade é complexa e assenta numa dualidade complementar. Por um lado, a construção original, sólida e pesada, remete para um espaço central como um peristilo romano. Este espaço fechado é permeável à luz, à visão e ao movimento, permitindo-lhe jogar com as transições entre os espaços. Estes elementos pré-existentes têm um acabamento branco mate abstrato para equilibrar o peso e torná-lo atemporal. Por outro lado, os elementos introduzidos têm uma abordagem mais contemporânea e sóbria. O pavimento e os armários feitos à medida suportam toda a funcionalidade, mantendo uma sensação de calor. Isto é conseguido através de uma paleta de materiais naturais, não só para realçar o carácter nobre do edifício, mas também para proporcionar uma experiência tátil completa. Folheado de carvalho nas peças de mobiliário integradas, pavimento com acabamento em palha de terracota, tons de marfim do quartzito que combinam o tom da madeira com as paredes brancas pré-existentes e, por fim, os pormenores em latão. No seu conjunto, criam uma harmonia de tons dourados refletidos no acabamento branco da construção original, retroalimentando-se mutuamente e integrando a história do local na nova narrativa que trará as novas personagens.